Meu filho, me perdoe,
pois pequei. Menino, você não soube crescer. Não te deixaram cair quando
necessário. Você sempre teve medo de cair. Sem a dor, te restou o sofrimento.
Onde aconteceu a derradeira fatalidade que te encaminhou para esta vida sem
sentido? Onde foi parar a sua vida?
Meu filho, me perdoe.
Você, que nunca amou, que nunca soube amar, sempre quis o amor. Mas nunca lhe
ensinaram a dor necessária à liberdade, ao amor.
Meu filho, me perdoe
por te exigir que fosse homem. Por quê não te deixei crescer sem ser homem? Não
se cresce homem, se cresce menino. Para o menino, não há limites. É necessário
ingenuidade para amar. Mas te ensinei a desconfiar, a ver maldade em tudo, a
temer demais. Te ensinei Deus e o diabo quando deveria dizer apenas “vá”, e
quando doesse, não lhe dissesse que era dor, que era ruim. A barata não é má, o
rato não é mau, a lacraia não é má, os vermes não são maus.
Lembro da boa sensação
que tivestes das ondas do mar. Quando derrubado, levantou, quase querendo cair de novo. Não tinhas medo de se
afogar, e por não saber o perigo, só havia o gosto salgado da água, os risos
fáceis de pegar jacaré, o carinho áspero da areia molhada.
Não sabias o que era
solidão. Foi quando te disse desse perigo que começastes a sofrer. Perdestes a
dor, o choro fácil. Afinal, chorar não é coisa de homem. Maldito homem este que
criei pra ti, que matastes a vida.
Meu filho, me perdoe
por ter te ensinado a pena, e não a compaixão. Te fiz sentir superior, olhar os
outros de cima. Por não viver, por não sentir de fato a dor que nos aproxima,
te tirei a necessária miséria ao corpo que vive. A soberba que te ensinei só
lhe trouxe a vergonha, o pudor, a tragédia.
O sentido, meu filho,
está na liberdade que te tirei quando te privei de descobrir.
A vida começa na dor,
meu filho, este era o ensinamento que deveria ter te dado primeiro. Mas quis
evitar o sofrimento de minha responsabilidade sobre ti, e por isso te matei a
vida.
Tua primeira inocência
perdestes no corpo. Aprendestes a noção mais
feia do belo que existe. Um corpo que vive sempre será belo. Quando te
disse “isto é belo” à primeira imagem por achar necessário serdes homem,
destruí teu senso estético.
Também aprendi tarde
demais.
Me desculpe.
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